quinta-feira, 11 de fevereiro de 2016

MACAU-Passará por Hong Kong e Macau, a salvação da China?


by Ponto Final
"Muito mudou na China após a crise financeira internacional e uma das principais mudanças prende-se com a transformação do paradigma que durante as últimas décadas pautou as relações entre Cantão, Macau e Hong Kong em termos de produção industrial.
As duas Regiões Administrativas Especiais e a mais industrializadas das províncias da China Continental começam a chamar a si novos papéis no âmbito da reestruturação geral da economia chinesa actualmente em curso. No passado, as três regiões cooperavam entre si tendo por base um modelo bem delineado: Hong Kong e, em menor proporção, Macau assumiam o papel de plataforma de re-exportação dos produtos produzidos em unidades industriais de média dimensão da vizinha província de Cantão.
Hoje, um grande volume de bens e mercadorias oriundos dos quatro cantos do mundo penetram na região do Delta do Rio das Pérolas através de Macau e de Hong Kong. Ao mesmo tempo, empresários e grupos industriais da província de Cantão anteciparam-se ao Governo Central  e assumiram a dianteira no projecto de internacionalização da indústria chinesa, ao criarem bases de produção noutros países.
Da mesma forma que liderou com avidez o crescimento económico à escala global ao longo de quase três décadas, a China está agora a construir uma sociedade que tem o consumo como principal sustentáculo. O comércio electrónico transfronteiriço, a aposta em serviços logísticos e o sucesso de plataformas como o Taobao ou o Alibaba são sinais de que a China está apostada em dar forma a uma nova tendência no que diz respeito ao comércio a retalho a nível global. O comércio de serviços entre Cantão, Hong Kong e Macau cresceu de forma exponencial no encalço de uma tal aposta. As duas Regiões Administrativas Especiais registaram dois dos maiores excedentes do mundo no que toca à venda de serviços turísticos.
A procura tem vindo a subir muito à custa do interesse que tais produtos e tais serviços têm despertado do outro lado da fronteira. O volume de bens importados por Hong Kong e por Macau não pára de crescer e um tal crescimento deve-se, sobretudo, ao interesse que tais produtos suscitam na China Continental.
Entre 2010 e 2014, por exemplo, apenas 30 por cento dos bens importados por Hong Kong foram consumidos por residentes da antiga colónia britânica. Durante esses quatro anos, as importações de Hong Kong cresceram em média sete por cento ao ano. No que toca a Macau, a taxa de exportação tem crescido a um ritmo muito mais rápido nos últimos anos que a taxa de importação. Apesar de tudo, em 2014 a RAEM importou nove vezes mais produtos do que aqueles que exportou.
Outro sinal de que os tempos estão a mudar está bem patente na orientação que tem sido dada ao sector logístico da vizinha Região Administrativa Especial de Hong Kong. Nos últimos meses , têm sido mais os voos e os contentores que trazem bens de consumo dos quatro cantos do mundo para Hong Kong do que propriamente os que transportam bens da China para o mundo.
A mudança ajudou a colocar em evidência o papel da cidade enquanto agente de mudança e centro de comércio internacional. Ao mesmo tempo, Cantão ter feito as pazes com a ideia de que a produção industrial perdeu potência e assume, sem preconceito, um novo papel como centro de distribuição quer dos produtos que entram na China via Macau e Hong Kong, quer dos produtos comercializados nas plataformas electrónicas com que a China procura revitalizar a economia e impulsionar uma sociedade de consumo.
Com parques logísticos de grandes dimensões, que facilitam o armazenamento de produtos oriundos da vizinha Hong Kong, Shenzhen deverá ter um papel essencial na afirmação de um novo modelo de consumo e desenvolvimento, ao passo que Cantão deve assumir, sobretudo, um papel de primazia no que toca à coordenação dos centros de distribuição dos produtos que alimentam o emergente comércio electrónico do país.
A indústria transformativa da Região do Delta do Rio das Pérolas tem vindo a perder gás e a sofrer alterações profundas desde o início do novo milénio. Dominado por empresários de Hong Kong, o competitivo panorama da produção industrial da vizinha província de Guangdong perdeu capacidade de afirmação e as margens de lucro desceram, fazendo com que o modelo de desenvolvimento que pautava as relações entre as três regiões perdesse o brilho de outrora.
No final de 2014, restavam na província de Cantão cerca de 20 mil unidades industriais pertencentes a empresários de Hong Kong. Em 2015, eram 50 mil.
Em contrapartida, em 2014 estavam instaladas em Cantão cerca de 25 mil empresas de prestação de serviços com sede na RAEHK, cerca de 53 por cento do total das empresas da antiga colónia britânica com interesses em Cantão.
Ao longo da última década, a produção industrial na vizinha província continental migrou da produção de bens de consumo de baixo valor acrescentado para a produção de maquinaria e de produtos electrónicos.
As mudanças não se ficam por aí. Em 2014, a província produziu investimento directo no exterior com um valor avaliado em 10 mil milhões de dólares norte-americanos. Desse investimento, direccionada para sectores que não a indústria financeira, 70 por cento foi canalizado através de Hong Kong.
A par com Macau, a antiga colónia britânica começou a operar como uma plataforma para as empresas chinesas que se procuram expandir fora de portas.
Os proveitos da mudança de rumo adoptada pelas autoridades da vizinha província de Cantão começam já a fazer-se sentir em Hong Kong, em sectores como o comércio, as finanças e o transporte de mercadorias. A região tem um papel central no financiamento, na representação e no apoio logístico concedido às empresas, que olham cada vez com maior interesse para os desígnios da internacionalização.
Em 2014, Cantão transferiu através da RAEHK bens no valor de 845 mil milhões de dólares de Hong Kong para o Sudeste Asiático e para outras regiões."

                                                                   Artigo publicado a 1 de Fevereiro no Hong Kong Economic Journal

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