quinta-feira, 3 de janeiro de 2013

Gazeta a preto e branco: África do Sul ( X )
















"8 de Dezembro de 1984
Dia de Seja o que Deus Quiser

Em Portugal, Dia de Nossa Senhora da Conceição. Aqui, Dia de Seja o que Deus Quiser: depois de uma tarde, por ser sábado, ou nos enganamos muito, ou as ruas vão ficar desertas. Pelo nosso lado, igualmente as não pisaremos, tanto mais que fomos convidados para um convívio de portugueses (ignoramos à partida, a sua localização) num prédio à beira da maior estação de caminho de ferro, predominantemente utilizada por negros, e onde, ao que afirmam, os roubos são frequentes.

Curiosidade intercalar: o elevador do hotel português em que nos encontramos, não pode negar a bandeira pátria que, como já referimos, tem na porta de entrada: sobe-se ao terceiro piso aos solavancos e, depois, sem abandonar a "cabina", é que se pode ir, aos estremeções, para o piso inferior... Subimos para descer, também num verdadeiro "seja o que Deus quiser". Simbolicamente, são os altos e baixos da história - desta "história", entenda-se.

Primeiros apontamentos da manhã: dois doentes negros, do Maputo, sentaram-se na nossa mesa ao pequeno almoço e ...

- Então, o que os trouxe à África do Sul?

- Estamos doentes e viemos tratar-nos ... - responderam, quase em uníssono.

- Mas ...

Silêncio. Acabara de chegar o café com leite das vaquinhas sul-africanas.

Mudemos o disco. Vamos ao repasto-encontro da tarde.


"O bem soa e o mal voa": a noticia de que ontem balearam um madeirense quando, por volta das oito da noite, fechava o seu comércio, tomou conta dos primeiros minutos do convívio, no grupo de uma ponta da mesa, à volta da qual se almoçava e cavaqueava. Em breve, contudo, o acontecimento foi esquecido, sem se saber se por razões de má rotina, se pelo facto de tristezas não pagarem dívidas. O almoço, esse, teve todas as honras, fazendo a barriguinha de pretexto para o cavaco e ... "lá fora", para o apalavrar de uns negócios pendentes ... Depois, depois jogaram-se as cartas, sem discriminações sociais.

E, já agora, a nossa simpatia para os comerciantes portugueses (alguns madeirenses) que nas lojas do prédio onde se realizou o convívio, e que está inserido em zona considerada perigosa, procuram ganhar a sua vida, trabalhando catorze, e mais, horas por dia, à frente dos seus estabelecimentos, frequentados por gente de aspecto nem sempre recomendável."

 Fui, na oportunidade, impedido, vamos lá saber porquê, de tirar uma fotografia ao grupo de portugueses ali presentes e que, depois de almoço, passou a tarde a jogar às cartas Escrevo-o pela primeira vez, passadas estas dezenas de anos. 

Havia medo? 

Medo de quê? 

Medo de quem? 

Que jogo de cartas era aquele? 

Que local, afinal, era aquele?

Quem eram os portugueses presentes?

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